8 de dez. de 2013

Cordão de Ouro - 1979

Gente, vou falar a verdade. Esse filme é tosco!

Eu sempre fui admiradora da "Psicodelia Brasuca", mas o diretor desse filme, Antônio Carlos da Fontoura, exagerou. Escravidão da era moderna, capitão do mato de Helicóptero, tribo africana em terra de caboclo, por aí segue o número de coisas estranhas que o filme traz.

Mas AINDA ASSIM, é um filme que vale a pena ser assistido, pois além de contar com dois grandes mestres capoeiristas, Mestre Camisa (fazendo papel de Ogum) e Mestre Nestor Capoeira (no papel de Jorge) traz também como tema o imaginário cultural que cerca a umbanda, os caboclos da mata e o culto aos Orixás.

Jorge é um mestre capoeira e escravo que após uma fuga se joga do alto de uma cachoeira com a proteção do caboclo cachoeira. Após a queda (provavelmente durante um desmaio, interpretei assim) Jorge é levado à Aruanda e encontra com Ogum, com quem joga capoeira e por quem é batizado. Recebe dele um cordão de outro como proteção e retorna para combater um vilão: Pedro Cem (interpretado por Jofre Soares).

O filme é uma pérola (risos)! Traz vários pontos de umbanda, conta com a participação do conjunto "Os Ogãs" que fizeram alguns discos nos anos 60.

É um filme interessante por retratar essa parte do "imaginário cultural" que cerca a religião, e pelas músicas. Não esperem nenhuma super produção, para quem gosta de filmes "B" é um prato cheio!

Segue o Link:


24 de nov. de 2013

A Estrela Oculta do Sertão

Porque a diáspora foi cruel não apenas com africanos. Segue um documentário sobre Marranos no Brasil e sua tentativa de resgatar as raízes judaicas.

O interessante é que o documentário mostra como alguns "sincretismos" permitiram à algumas famílias identificarem sua origem Marrana. A partir disso elas, ou alguns membros delas, puderam buscar uma melhor compreensão sobre velhos hábitos tradicionais, e, em alguns casos um resgate a religiosidade judaica (judeus retornados).

Por meio do vídeo percebemos que a "busca das raízes" não é um tema africano, ou indígena, apenas.



Algumas leituras sobre o tema:

1) Ser Marrano em Minas Colonial - Anita Novinsky (USP)

2) Aspectos Fundamentais para o Estudo do Marranismo - Marcos Silva (UFS)

(Os artigos que não li ainda)

3) O fenômeno marrano no Brasil, da colônia aos nossos dias- Angelo Adriano Faria de Assis (Universidade Federal de Viçosa)

4) A PRESENÇA DO DIABO NO COTIDIANO MEDIEVAL JUDAICO: OS RITOS DE PASSAGEM (esse é por interesse pessoal sobre o misticismo judaico).

23 de nov. de 2013

O Jardim das Folhas Sagradas

Decidi, com o fim de tornar o Blog mais interessante, fazer uma parte de cinema, com filmes que abordem temas próximos a umbanda. Escolhi, para estreia desta parte, o filme O Jardim das Folhas Sagradas.


O filme conta a história de um homem que abre um terreiro de candomblé e, contra corrente dos Axés, o faz sem matança de animais. Durante todo o filme vê-se um grande apelo à questão ambiental e uma divulgação da forma como o a natureza é tratada, por meio do culto às folhas. Mas não apenas isso encontramos no enredo do filme.

Aborda, também, como tema para debate, a mistura entre culturalismo e religião. Acredito que este tema é atual dado o número de estudos antropológicos em terreiros com a finalidade de resgate de uma identidade cultural. Há momentos no filme em que percebemos claramente a mistura e, para bom entendedor, ela não é positiva. É palco de vaidade e, por vezes, transforma o que deveria ser um templo, em "espaço cultural", aberto demais ao público..

Além do recado que o filme dá em relação à possibilidade de um culto de candomblé sem matanças (que prefiro não comentar por não ser entendedora do assunto), existe o recado referente ao cuidado que devemos ter ao tentar buscar "cultura" dentro dos ritos. Não misturar os campos. Não tratar a religião como um evento cultural. Ao final percebemos que o principal da religião não é vista, acontece longe dos olhos do público e dos curiosos. Que "o que é do santo" não deve ser tratado com a leviandade e a materialidade com o qual costumamos tratar as coisas. É algo que vai ao encontro com o que aprendi na minha trajetória, não são grandes festas e eventos que tornam um terreiro um "chão bom de se pisar". Ao contrário, as melhores coisas se faz em silêncio e longe dos olhos curiosos... é algo que cai bem para o candomblé e para a umbanda, também.

Acho o filme bonito e vale à pena assistir.





22 de nov. de 2013

Qual o terreiro de candomblé mais antigo do Brasil?

Hoje, novamente, me deparei com um documentário postado por um amigo de Natal no facebook e que me trouxe várias reflexões, algumas das quais eu coloco aqui.

Existe, ou existiu, certa rixa aqui no Brasil entre terreiros para saber qual é o mais antigo. A antiguidade traria, consequentemente, um status de "pureza" ritual, reafirmando uma identidade originária africana. Na sequência, vem a negação de sincretismos e coisas afins, como forma de validar e revalidar essa identidade. Afinal, sincretismo com catolicismo servia apenas para proteger a religião negra de preconceitos, conforme muitos ainda dizem.

O fato é que esse documentário tenta "resgatar" essa ideia, não explicitamente, mas pelo simples fato de haver no terreiro um marco que registra sua fundação, ainda no séc XVII - Um busto de Castro Alves e a data de 1658. Considerando que nesta época o tráfico de escravos ainda era vigente no país, não parece ser necessário nada a mais para legitimar a antiguidade do culto e, portanto, sua proximidade com as raízes africanas. O documentário retrata um terreiro Jeje, no município de Maragogipe no Recôncavo Baiano. Uma das afirmações fortes que o documentário traz, por parte de um dos historiadores entrevistados, é justamente a negação do sincretismo em prol de uma identidade africana.

Curiosamente, como tenho lido a respeito dos sincretismos, o documentário me fez lembrar de um artigo que li há tempos atrás: As Metamorfoses de Sakpatá, Deus da Varíola  de Claude Lépine. A cultura Jeje, que cultua Voduns, veio da região do Dahomé, justamente a região que Lépine estuda em seu artigo. Ela nos conta que antes de serem migrados para terras escravistas, os negros capturados, passavam um tempo no Dahomé. Nesta região, justamente pela política escravista, foi formado um panteão que reunia todos os deuses das diferentes tribos capturadas. Cito:

Realizou-se também naquele período um trabalho de sistematização e de organização da multiplicidade dos deuses dos povos incorporados ao Danxome.  Este trabalho deve ter sido realizado e se cristalizou no decorrer do século XVII, sob a orientação dos sacerdotes submetidos ao Ajaho (ministro dos cultos), e resultou na elaboração de um panteão. Estabeleceu-se uma classificação do conjunto das entidades, que foram repartidas em nove "coros" (...) Tratava-se de subordinar todos os cultos ao culto real e de fazer dele um símbolo de unidade.

Enfim, mesmo que o culto mais antigo do Brasil, mantenha algo de originário da África, manterá  já um sincretismo formado nas zonas portuárias, onde os escravos de diversas etnias se concentravam antes de embarcarem. E, consequentemente, vários, Voduns, Orixás e Nquices tiveram seus significados mesclados, nomes associados a ponto de se tornarem "qualidades". Houve um "sincretismo" antes mesmo da vinda para o Brasil, ou para outros países escravistas. Mesmo Sapaktá, ou Obaluayê passaram por esse sincretismo sendo relacionados com a Varíola no mesmo período.  Para saber mais um pouco, o blog saravá umbanda copia parte do texto de Lépine.

Onde quero chegar com isso? Não quero desmerecer os terreiros mais antigos, ao contrário. Tenho muito respeito e, com sinceridade, senti vontade de pisar no Terreiro do Pinho, retratado no documentário) e sentir a energia daquele solo. Meu objetivo é, somente tentar mostrar que o conceito de sincretismo é mais profundo do que parece a primeira vista. Sincretismo não se relaciona apenas com a presença de elementos católicos nas religiões afro, ao contrário, antes mesmo da vinda ao Brasil já haviam sincretismos. Um desses "sincretismos" é o da religião trazida pelos Haussás, muçulmanos, tema de uma postagem anterior.

Enfim, Apesar de tantas reflexões, achei o documentário ótimo! Vale muito à pena assistir. Claro que ele traz mais elementos para reflexão. Mas no momento, como estou lendo acerca do sincretismo, essa idéia de "puro" que necessita a sua negação, me chamou mais a atenção.





8 de nov. de 2013

Mandingos, Malês, Kimbandas

Mandingo (Roque Ferreira)

Devagar com esse nêgo mandingo
Ele sabe apanhar a folha
Sabe mexer na erva
Sabe rezar a reza
Sabe curimar
Quando bate vem cabôco e orixá
Quando dança tudo que é erê vem dançar
Nó de amor que ele faz ninguém desata
Ele é dono do tempo, do vento,
Do mar e da mata
Ói que esse nêgo malê
Foi rei no Senegal
Vem de lá o seu poder
Para o bem e para o mal
No pescoço um talismã
Na cintura um tecebá
Seu remédio é curador
Seu veneno é de matar
Foi nas águas de Oxum
Que lavou seu colar
Mas é Ogum Xoroquê seu Eledá

A letra acima retrata um um Negro Malê, bruxo, mandingueiro, daqueles que quando aparecem na umbanda, costumam causar um certo ar de mistério. Muitas vezes as entidades chamadas "kimbandeiras" trazem esse estigma de bruxaria pesada, algumas vezes trazem elementos não apenas da cultura africana, e sim pertencentes a tradições aparentemente "estranhas" ao africanismo. A Cruz de Caravaca; a estrela de 6 pontas chamada , também, como Selo de Salomão; as contas; as rezas; os talismãs; além de um conhecimento mais apurado sobre certos assuntos.

Dizem que estas entidades trabalham com os Exus, por serem estes que na umbanda lidam com as energias mais pesadas de magia. Mas não é este o aspecto que pretendo abordar aqui.

Se buscarmos nas histórias sobre o povo Negro no Brasil, encontramos em Narrativas como a de João do Rio em, As Religiões do Rio, histórias sobre como os negros malês eram mais distantes dos demais negros. Primeiro por serem muçulmanos, segundo por que o islamismo praticado por eles não era isento de sincretismos com religiões locais da África e, portanto, cheias de misticismo e traços de magia. Eram cultos, letrados e dominavam feitiços desconhecidos dos demais negros de origem banta e nagô. Junto ao islamismo, cultuavam, como João do Rio retrata, os aligenum, espíritos ruins, equivalentes aos Djins árabes, mas chamados de Guinnê, dyiné, adjan (Arthur Ramos, As Culturas Negras, Cap.VI).

Não eram tão submissos quanto outros grupos negros, foram protagonistas de revoltas na Bahia, a revolta dos malês, cujo resultado foi praticamente um extermínio desse grupo. Os que não foram mortos, foram pegos e deportados de volta à África, alguns poucos que permaneceram no Brasil, viviam uma vida austera e reservada. Outros se converteram ao cristianismo, como retrata Edison Carneiro (Religiões Negras, 1991,p. 73). Até que com o tempo foram totalmente (ou quase totalmente) extintos, justamente em razão de seu isolamento. Segundo João do Rio: Os alufás [sacerdotes malês] não gostam da gente de santo a que chamam auauadó-chum; a gente de santo despreza os bichos que não comem porco, tratando-os de malês.

Além da evocação aos aligenum, outras curiosidades destacadas por Arthur Ramos sobre os malês são o costume de usar arroz queimado (carvão) para escrever em pequenas tábuas, que depois de lavadas ingeria-se a água da lavagem para adquirir virtudes mágicas; o uso de pequenas bolsas com rezas, orações, seladas por símbolos cabalísticos, tais como o selo de Salomão; O uso do Tecebá, um colar com três séries de 33 contas.
Selo de Salomão


Além dessas curiosidades, há algumas outras retratadas, tal como a
origem de certas expressões como "fazer sala", que se remete às orações feitas pelos malês durante do dia, cujo o primeiro termo da oração era Salah. Também o próprio termo mandinga, cuja origem está no grupo dos mandingos, também, muçulmanos africanos vindos para o Brasil e aqui designados como malês.


Mashbaha Muçulmano com 99 contas, tal como o Tecebá.


De Acordo com Arthur Ramos, mesmo com extinção dos malês alguns traços de sua cultura permaneceram mescladas à cultura banta, resultando em sincretismos, que podem ser percebidos em terreiros das macumbas com sincretismos variados.

Há mesmo um estudo que trata da influência dos malês nos cultos  pernambucanos, cujo link segue abaixo:



Acredito que com esse pequeno resumo já dê para entender um pouco melhor alguns sincretismos que aparecem na umbanda, bem como a música de Roque Ferreira interpretada pela Roberta Sá com o qual encerro essa postagem. 


7 de nov. de 2013

A relação indivíduo, entidade de umbanda e terreiro.

Sônia reclamava muito de seus guias, inclusive de seu preto velho, o qual, quando incorporava, jogava-a no chão, machucando-a, e resolveu um dia não recebê-lo mais se ele continuasse a fazer isso. Seu meio problema, no entanto, era seus guias não falarem. Este fato significava que não possuíam, não incorporavam integralmente o cavalo, ficando apenas encostados nele. 
Essa preocupação de Sônia reafirma o que foi dito no capítulo II sobre a identidade do médium como pessoa. Essa identidade se constrói a partir da relação do cavalo com seus guias. Se essa relação não é completa, o médium perde a possibilidade de, através dessa máscara, ou seja, de seus guias, integrar seus diversos papéis sociais. Sônia não conseguia essa relação e, portanto, não conseguia definir sua identidade como pessoa [dentro do terreiro].
Maggie,Y; Guerra de Orixá, 3a. Ed. Ed. Zahar, 2001, pp. 102,103.

Já tem algum tempo que li o livro "Guerra de Orixás" da Yvonne Maggie. Na ocasião achei o livro tenebroso. Mas depois dos últimos acontecimentos percebo que tem boas deixas a pesquisa realizada pela Yvonne. Uma delas, e a meu ver o principal, é a forma como a identidade pessoal do médium se constrói dentro da religião (e algumas vezes fora, também). Essa questão aparece na parte final do livro e é descrita de duas formas: a) a identidade se constrói pela eficiência da relação do médium com seus guias; b) a identidade se constrói pelo reconhecimento do "poder" dos guias deste médium (e consequentemente, do médium) pelo grupo.

Quando se entra em um terreiro como médium é como se começássemos uma vida nova, onde todos os nossos conhecimentos anteriores podem ser colocados em cheque a qualquer momento. Por essa razão é aconselhável ao médium novo que mude a sua postura dentro do terreiro: que seja mais receptivo, observador, que tente prestar mais atenção naquilo que se aproxima. Digamos que haja, nessa ocasião, um novo aprendizado: aprender a lidar com as chamadas "intuições" e com as energias que se aproximam a fim de saber classificá-las como positivas ou negativas. Digamos que este seja o momento "0" (Zero) do processo de aprendizagem. Usando a metáfora do filósofo Locke, no momento inicial, na ocasião do ingresso do médium ao terreiro, este deverá ser como uma tábula rasa onde as energias que cercam o ambiente possam deixar suas impressões. Eu poderia entrar aqui em diversas questões que colocariam em jogo o uso dessa metáfora, como, por exemplo, o fato de Locke ser um empirista, filosofia que parece avessa ao tipo de coisa que trato aqui. Porém, há algo a ser experimentado neste momento "zero", mas que não se parece em nada, absolutamente, com o conceito de experiência tratada pelo empirismo filosófico. Importa que, para fins didáticos, a metáfora é útil para exemplificar o que pretendo dizer.

A etapa que se segue é: ele começa a receber a energia dos seus guias, mas ainda não as identifica. Em seguida, passa a identificá-las e diferenciá-las - a energia do caboclo é diferente da energia do preto velho - antes mesmo que o médium incorpore esses guias. Esta segunda etapa é fundamental para o bom desenvolvimento do relacionamento do médium com o terreiro que o acolhe. O bom médium é aquele que sabe dar passagem à entidade certa na hora certa. Estes dois tipos de aprendizados aqui descritos são comumente chamados de "doutrina", dada ao médium para ele não cometa gafes e nem desequilibre a energia da corrente na qual ingressa.

As duas etapas são fáceis de serem atravessadas se auxiliado por um bom Chefe de Terreiro. A terceira e quarta etapas, que descreverei agora, é que são a meu ver, as mais complicadas.

A terceira etapa é o processo de incorporação. Geralmente é a primeira a ocorrer com o médium no terreiro. Normalmente neste processo ocorrerá uma repetição gestual, que fará com que o médium identifique qual entidade está incorporando, e se essa incorporação ocorre no momento correto. Exemplo: pretos velhos vem curvados, caboclos mancam e atiram flechas, Ogum porta uma espada. A variação gestual será pequena entre os médiuns de um mesmo terreiro. Aliás, esta é uma coisa interessante a ser observada: geralmente, um médium que venha de outro terreiro, terá neste processo um gestual diferente, aprendido no seu terreiro de iniciação e que servirá para o médium, individualmente, para identificação da entidade.

A quarta etapa é quando o médium começa a receber informações a respeito de suas entidades. Normalmente este processo é o mais confuso, pois nem sempre o médium está seguro dessas informações. Muitas das vezes a certeza vem, ou de um processo de repetição da informação para o próprio médium, ou da confirmação via fala da entidade incorporada, junto ao chefe da casa. Na maior parte dos casos, a segunda forma é a que dá maior segurança ao médium. Ou seja, mesmo que o processo de repetição tenha ocorrido, o médium depende da afirmativa de outro para dar segurança e "validade" àquela informação. Isso vai desde a identificação da entidade, até informações sobre situações e procedimentos específicos. Já nesta etapa, podemos identificar a dependência que o médium tem em relação ao contexto "social" onde ocorre a transmissão da informação.

A questão é que, quando o médium muda de terreiro, o seu "contexto social" muda. Nesta mudança outras podem vir a ocorrer. Há relatos de médiuns que ao trocarem de terreiro, trocaram de entidades. Há médiuns que acabam perdendo a confiança em si mesmo, como a médium retratada por Yvonne em seu livro, tornando frágil a relação com as entidades que já conhecia anteriormente. Há outros que, por vaidade, se afastam por senti-la ferida.  O fato é que dificilmente um médium passa absolutamente ileso de um processo de mudança.

Uma das coisas que contribuem para isso é a forma como, geralmente, as casas recebem médiuns que já vem de outras casas. Eles nunca, ou quase nunca, começam em uma casa nova no mesmo estágio em que pararam antes. Faz parte de um procedimento das casas um período de adaptação e "conhecimento" deste médium, para observação, garantindo, por um lado, a manutenção da seriedade do trabalho das casas e, por outro, que o médium ingressante se mostre sério e digno da confiança da casa. Este momento inicial funciona como uma espécie de "filtro" que evita que pessoas mal intencionadas ou ditas vaidosas permaneçam e quebrem a força da corrente da casa.

A questão que levanto é: como conciliar a necessidade de manter a seriedade e o equilíbrio vibratório de uma casa, com a necessidade que o próprio médium possui de reafirmar sua mediunidade e relação com entidades? Principalmente, quando as informações que o próprio médium possuem acabam sendo legitimadas pela confirmação do chefe da casa anterior, como manter essa certeza neste período incial onde tudo é colocado em cheque?

A única resposta que vejo como possível para este caso é que os médium mudem as suas posturas em relação ao desenvolvimento. Que pensem menos em confirmações externas para as informações que suas entidades passam, que aprimorem a sua percepção em relação às energias que virão a sentir, para saber, ele mesmo, diferenciá-las sem necessidade de outrem.  É um caminho complicado, mas muito necessário nos dias atuais onde a variedade de terreiros é enorme, não apenas em número, mas em formas de pratica umbandista. Caso o médium consiga esse equilíbrio interno, independente da casa onde esteja, ficará mais fácil se adaptar à contingência de uma mudança de casa, caso seja o necessário. Claro que em certas situações é necessário poder contar com alguém mais experiente, mas o médium não pode perder de vista que, mesmo a pessoa mais experiente não carrega as mesmas energias e necessidades que ele próprio. Não se trata apenas de autoconhecimento, mas de dar uma chance a um relacionamento com as entidades que não seja totalmente dependente da aprovação prévia do terreiro, tal como sentia a médium retratada pela Yvonne em seu livro. Enfim, é mais um conselho, que uma conclusão definitiva.