Essa semana foi atípica para os que militam na seara espiritualista. Uma menina de 11 anos, candomblecista apedrejada no subúrbio do Rio, um templo apedrejado no humaitá, zona sul do RJ. Ainda no RJ um médium da casa de Frei Luiz foi brutalmente assassinado, a razão ainda é desconhecida. E mais o túmulo de Chico Xavier foi danificado à pauladas. Nas redes sociais há uma grande mobilização de umbandistas, espíritas, candomblecistas e até mesmo alguns evangélicos, contra ações violentas que atingem as religiões espiritualistas, principalmente as de matriz afro.
Simultaneamente a isso, algumas velhas observações vieram à tona em minha mente, as quais quero compartilhar aqui.
Já tem tempo que observo que a umbanda não é mais uma religião "popular" e feita "para todos". Muito embora as portas dos templos umbandistas estejam abertas para qualquer um que queira entrar - sem distinção de classe social, econômica ou cultural - é fácil observar que os principais adeptos e frequentadores da religião nos dias de hoje são pessoas, em sua maioria, de nível sócio-cultural razoável. Com isso digo, pessoas alfabetizadas, com ensino médio completo e algum curso complementar (curso técnico, superior, etc...). Enquanto isso, nas igrejas evangélicas que se proliferam à olhos vistos, vemos maior incidência de pessoas com classe sócio-cultural mais baixa. Antes que alguma inferência equivocada surja, não pretendo dizer que os índices de violência estão relacionados à classe sócio-cultural das pessoas. Não, não é isso! Meu objetivo é, na verdade, questionar o que nós possamos estar fazendo de errado para que, em uma dada comunidade ou bairro, uma maioria menos culta prefira à igreja que o terreiro.
Não é incomum vermos entre os evangélicos depoimentos sobre passagens à terreiros de umbanda e candomblé que antecederam o seu ingresso na igreja. Uma parcela abandonou os terreiros por não se adaptarem aos preceitos que exigem, muitas das vezes, uma mudança radical nas concepções de comunidade: exemplo, antes de ser um Yaô, no barracão de candomblé, deve-se comer no chão e com as mãos... No terreiro de umbanda, deve-se aprender a servir na cambonagem e em outros serviços da casa, antes de ser um médium de atendimento. Outra parcela abandona pela insatisfação de não verem seus problemas resolvidos de forma imediata. Em ambos os casos, falta instrução sobre a religião. E, de fato, vemos muitas casas que pecam em relação a isso: ou pecam pela ausência absoluta de informação, tanto para os médiuns quanto para a assistência; ou pecam pela informação transmitida de forma inadequada, em linguagem "erudita" demais. No segundo caso, a erudição nem está no vocabulário usado ou coisa parecida, mas na forma de transmissão.
Eu sempre relembro as histórias do início da umbanda de Zélio de Morais "umbanda simples de coração, para os simples". Mas os simples de 1918, já tinham uma cultura um pouquinho melhor que os simples de hoje. Talvez falte adaptação da umbanda ao meio... Se por um lado já não se pode mais trabalhar na umbanda sem nenhum estudo, por outro um estudo demasiado teórico não facilita a comunicabilidade com esses setores mais carentes. Será que a umbanda de hoje é, de fato, para os mais simples? Fica aqui a dica para reflexão!
Minha reflexão é crítica sim, mas crítica no sentido de repensarmos a prática dos terreiros e a forma de lidarmos com as pessoas. Não creio que apenas a falta de cultura seja determinante para a disseminação do ódio generalizado que as Igrejas pregam. Mas acho que há algo, também, no que move a procura e a permanência das pessoas nesses locais. Deve existir algo, algum diferencial na forma de comunicar de um pastor evangélico, em relação à forma como a umbanda hoje comunica a sua doutrina. Se até mesmo a igreja católica conseguiu repensar seus dogmas e seus ritos em função do crescimento do protestantismo, porque nós, umbandistas e espiritualistas não podemos, reflexivamente, repensar e tentar identificar pontos de mudança na nossa forma de lidar com as pessoas?
Fica a sugestão de reflexão...